Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 27 de dezembro de 2008

Marley e Eu

O encantador cachorro Marley sai dos livros e ganha as telas com maestria mais admirável do que o recente “Crepúsculo”. Para quem imagina um filme bobo e vazio, “Marley e Eu” impressiona pela capacidade de divertir, emocionar e se tornar inesquecível para quem gosta ou não de animais.

Lassie e Beethoven são dois dos cachorros que mais fizeram sucesso nos cinemas. Abolindo a idéia daqueles animais falantes e engraçadinhos que protagonizam comédias prontas, Lassie e Beethoven mantiveram a idéia de mostrar animais como estrelas de um filme com sua esperteza, inteligência e fidelidade. Outros bichos também sempre foram usados para conquistar o carisma do público, de baleias a macacos. O que importa é que agora é um novo cachorro que revitaliza esse formato peculiar de elenco: Marley. A graciosidade da obra escrita por John Grogan em sua obra homônima não tardaria para ir aos cinemas. O sucesso do longa quebra qualquer preconceito ou ingenuidade sobre filmes com animais e se configura como a melhor opção atualmente nos cinemas brasileiros.

O labrador Marley cai na vida de John Grogan (Owen Wilson) e sua esposa Jenny Grogan (Jennifer Aniston) como uma válvula de escape para que eles possam treinar a maternidade para um futuro filho. Vendido por um preço mais barato que os outros labradores, Marley chega à casa de John e Jenny aprontando todas. Ele é praticamente hiper-ativo, não pode ver um objeto que vai logo morder, engana seus donos com sua esperteza e não deixa ninguém em paz. O “pior cachorro do mundo” acompanha, durante sua vida, a construção da família Grogan, seus problemas profissionais e mudanças. Além de um filme sobre amor aos animais, é acima de tudo uma dramédia sobre o que valorizamos na nossa vida, quem cultivamos nela e o que podemos esperar ou não das pessoas.

O roteiro de Scott Frank adapta um conjunto de histórias que John passou a escrever para um jornal que trabalhava. Tais histórias são parte do livro que virou best-seller mundial e pode ser encontrado nas livrarias de todo o país. A trama não se contenta apenas em mostrar um cão bagunceiro, mas investe em como John e Jenny possuem uma relação única com o animal. Marley é um motivador de tudo que o casal começa a desenvolver em sua vida, desde os dilemas profissionais (os dois são jornalistas) até os filhos que nascem meio à zorra de Marley.

Scott Frank oferece um texto basicamente simples, mas repleto de ocasiões graciosas de Marley. Nada ali parece programado, personalizando o cãozinho como uma das grandes surpresas do elenco do filme. Ele é impossível e a qualquer momento pode fazer algo desagradável ou engraçado. Mostrar a recusa de Marley em um curso de adestramento, por exemplo, é outro fato impecável para a trama, principalmente porque seus donos têm tanto amor que encaram o fato com muito bom humor.

A família Grogan dá a Marley o tratamento que daríamos a qualquer pessoa de nossa convivência, e o cão responde a isso, mesmo sendo temperamental. A maior lição de vida que podemos tirar dessa relação incrível mostrada no filme é narrada em off por John na última cena, em que ele questiona quantas pessoas nos fazem sentir tão especiais quanto nossos animais de estimação. É aí que cai a ficha de que “Marley e Eu” é muito mais do que um filme de cachorro, mas um filme de relações, de amor, de crença e de dedicação. E ainda: as subtramas são sempre bem alimentadas pelo roteiro, nunca deslocando os conflitos jornalísticos vividos por John e Jenny, nem mesmo excluindo a importância do crescimento da família Grogan a cada filho que chega.

Um roteiro tão simpático poderia ser destruído pela falta de sensibilidade e tato de um diretor inadequado. Foi aí que, depois de seu bom trabalho em “O Diabo Veste Prada”, David Frankel faz outro grande filme para sua filmografia. Frankel tem toda a paciência do mundo para atingir os objetivos das cenas, oferecendo ao elenco também a liberdade de improviso para as trapalhadas de Marley. Todas as cenas em que o cão demonstra alguma travessura são naturais, deixando claro que o animal foi tratado com respeito e dedicação pela equipe técnica do filme para render os maravilhosos momentos do longa.

Ainda neste quesito vale a pena destacar a química entre os cães utilizados e os protagonistas Owen Wilson e Jennifer Aniston. Eles demonstram seu carinho pelos animais e isso é natural ao ponto de tornar as seqüências tão realistas que parecia que eles estavam brincando em pleno trabalho e abertos a qualquer coisa que poderia acrescentar mais graça à produção. Os dois atores têm uma sintonia incrível e trazem vitalidade à trama, sem deixar o filme parecer bobo. No elenco também temos a experiência e carisma de Alan Arkin, como o esquisito chefe de John, e Eric Dane, como Sebastian, amigo de John, que basicamente repete a vibe de mulherengo que possui no seriado "Grey's Anatomy".

Mais do que um filme sobre cachorros, “Marley e Eu” fala de amor e de como as pessoas (ou os animais) catalisam isso nas nossas vidas. O longa diverte e emociona em suas devidas proporções, sem nunca parecer cansativo ou desinteressante. Não é preciso gostar ou ter um cachorro para simpatizar com Marley; o que o público precisa é se entregar a um conto quase mágico e que transmite com carinho e sensibilidade a importância que Marley tem na vida de uma família. A maior motivação é saber que, não importa quanto tempo passe, quando o amor é verdadeiro, ele não acaba e supera qualquer dificuldade que a vida possa impor. “Marley e Eu” é simplesmente imperdível!

Diego Benevides
@DiegoBenevides

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