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TURISMO NO BRASIL - FORA E DENTRO DA FICÇÃO
POR QUE VIAJAR AO BRASIL? - REAÇÕES E ARGUMENTOS - O CASO “SIMPSONS”
Material produzido por Diego Benevides

 

Até onde se ofender? O primeiro fato é que de mocinho o Brasil não tem nada e a imprensa já nos deu provas suficientes: “Turista morre durante assalto na Praia Grande”, “Turista português morre esfaqueado em Copacabana” ou “Mais um ônibus de turistas é assaltado no Rio”. O que precisa ser analisado é até onde isso é banal sem deixar de ser sentimental. Claro que uma vida que é retirada por causa da criminalidade sempre é motivo para todo um aparato de revolta dos familiares e denuncia o fraco sistema da nossa sociedade, mas o que merece ser colocado em discussão é se estas coisas acontecem somente no Brasil. A resposta é óbvia quando se encontra também nos jornais: “Brasileiro é morto por engano pela polícia em Londres”, “Brasileiro é morto a facadas em Toyokawa” ou “Brasileiro seqüestrado morreu ao chegar no cativeiro no Iraque”. O que fica claro é que os problemas de violência e marginalização tomaram uma proporção global e a população em geral está sujeita a tudo em qualquer parte do mundo. O processo é reverso e quando uma produção cinematográfica decide implantar suas raízes nas mazelas sociais de algum país e criar tanta polêmica como tem sido feito desde a divulgação de “Turistas”, claro que há a possibilidade de haja uma revolta por parte de quem é apontado “criminoso”, pelo simples receio de poder denegrir a imagem turística do local. A partir disso, a única alternativa a ser trabalhada é conseguir separar a ficção da realidade e perceber que polemizar acerca disso só dá mais autoridade e gás para o filme ser bem vendido, pois bem ou mal aceito pelo público, ainda terá muita gente que, por curiosidade, irá conferir a produção. Levando esta situação ao extremo, a bilheteria nacional de “Turistas” pode render tanto devido às discussões que, se duvidar, podem até criar o “Turistas 2”, repetindo a façanha de Eli Roth na franquia “O Albergue”, que tem uma temática semelhante e esculacha a Eslováquia, sendo rotulada como terra de psicopatas impiedosos e sanguinários.

Os retratos de sociedades espalhadas por todo o mundo são constantes abordagens que Hollywood faz para ambientar a história de seus filmes. Parece que pegam todas aquelas idéias caricatas do objeto de trabalho e jogam tudo em uma película sem pensar que pode incomodar muita gente. Quantas vezes a vida de negros, japoneses, culturas maias, astecas, países X, Y ou Z foram alvos de péssimos roteiristas que os trabalharam com inconsciência, gerando discussões, proibições e até o cumprimento de penas judiciais? O que é comum a tudo isto é que, de certa forma, um filme precisa se passar em um determinado local e necessita informar ao público as características deste. Um exemplo básico disto são os filmes americanos fiéis que mostram loiros dos olhos azuis vivendo em uma sociedade requintada, que pegam táxis amarelos a qualquer hora nas ruas ou que podem deixar suas casas destrancadas durante a noite. Ou então aquele ritual de Dia das Bruxas, quando crianças simpáticas vão pedir doces de porta em porta, ou até aquela história que retrata o “american dream” de quem vence na vida e vira um milionário por isso. Isso tudo são estereótipos e, de certa forma, o cinema não vive sem eles. Toda história precisa ser baseada em fatos palpáveis ou ao menos imagináveis e o senso comum dificilmente é deixado de lado. O que temos visto ultimamente no cinema hollywoodiano é uma overdose de clichês que chegam todos os anos nas salas de projeção mundiais e desapontam o público exigente por enredos realmente bons. Por outro lado, conseguimos perceber também aqueles filmes que já conseguem lidar com os clichês de forma menos caricata, sem atingir a inteligência do público.

 

Os turistas são atraídos por nossas belezas naturais, mas cadê a estrutura para atender a demanda?

 

Esta não foi a primeira vez que a indústria cinematográfica registrou uma visão negativa sobre o Brasil e talvez não seja a última. A polêmica tem crescido justamente porque os brasileiros tomaram a dor do país e quiseram gerar até boicotes nestes meses de divulgação. A própria Embratur havia pedido ao público que tenha uma noção mais apurada de que “Turistas” não passa de uma ficção, mesmo com a declaração de que o roteirista Michael Ross teria dado afirmando que escreveu tudo baseado em “fatos reais e fáceis de acontecer”. A pesquisa de campo de Ross e do diretor John Stockwell se deu após uma excursão pelo litoral da Bahia, coletando informações sobre o cenário natural e relatos da população para estarem aptos a ter um roteiro realista ao extremo. O resultado foi uma mistura de tudo do que já era esperado e que, de certa forma, conhecemos muito bem: praias exóticas, garotas de biquíni, muita bebida (envenenada), drogas, índios (“do mal”), além de ter localizado a Amazônia bem pertinho do Rio de Janeiro. É neste cenário que um grupo de jovens turistas se aventuram no Brasil para conhecer nossas belezas, mas que acabam sendo vítimas de roubos e passam a lutar por suas vidas em uma terra, como dita no trailer, “onde vale tudo”. Os jovens acabam tendo que lidar com vilões loucos por carnificina que roubam seus órgãos para vender no mercado negro, tematicamente semelhante ao longa de Stephen Frears, protagonizado pela eterna Amélie Poulain, Audrey Tautou, intitulado “Coisas Belas e Sujas”, mas que teve uma aceitação arrebatadora, sendo inclusive indicado ao Oscar de Melhor Roteiro Original, sem contar com as nomeações a Baftas e European Film Awards, fato este que jamais acontecerá com “Turistas” e os motivos são os mais óbvios possíveis.

População, imprensa, governantes, todos estão ligados ao que “Turistas” podem trazer de mal para o país. Será que existe mesmo a possibilidade de diminuir a demanda de turistas para nossas terras ou somente nosso ego foi ferido? Ao mesmo tempo em que sabemos que tráfico de órgãos não é o maior índice de criminalidade no Brasil, a caracterização de uma terra perigosa é que vem mexendo com a sociedade, coisa que jamais queremos ser rotulados. Seria rótulo mesmo? De qualquer forma, acredito que após “Coisas Belas e Sujas” não tenha havido nenhuma recriminação grave contra funcionários de hotéis londrinos envolvidos com cirurgias mortais que resultam no tráfico de órgãos. Do mesmo jeito que o medo de uma “Anaconda” que aterroriza um grupo de documentaristas na Floresta Amazônia acabou tendo somente seus quinze minutos de fama em 1997, quando o filme chegou chocando os brasileiros. Vale ressaltar que às vezes os cineastas locais acabam fazendo projeções estereotipadas ao extremo sobre nossa sociedade e isso acaba “ajudando” a queimar o filme do Brasil exteriormente. Muitas pessoas ainda acham que residimos todos em favelas ou que falamos espanhol, comemos como aborígines e nos vestimos que nem índios. Por mais ridículo que isto possa soar, é a visão projetada erroneamente no exterior, do mesmo jeito que aqui no Brasil consideramos as novelas mexicanas aqueles dramalhões sistemáticos e previsíveis. Isso tudo se junto a um grupo de (más) impressões que são sim difíceis de serem contornadas, mas acredito que a alienação de algumas pessoas que possam achar “Turistas” um retrato da realidade possa dar espaço ao bom senso.